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Este blog é apenas uma voz que clama no deserto deste mundo dolorosamente atribulado; há outros e em muitos países. Sua mensagem é simples, porém sutil. É uma espécie de flecha literária lançada ao acaso, mas é guiada por mãos superiores às nossas. À você cabe saber separar o joio do trigo...

31 de julho de 2011

Vazio de que?

Reflexões

É maravilhoso! Não há outra definição, ou melhor, não há como definir o quão gratificante é perceber o desdobramento dos fatos, das situações, por vezes profundamente dolorosas que antes não tinham como ser percebidas, assimiladas, compreendidas. Sempre deixei claro em meus textos, o quanto me ressentia com os constantes ataques de tédio, insatisfação e vazio, sentimentos estes que eram seguidos de uma imperiosa necessidade de preenchimento, e que me roubavam a capacidade de desfrutar a vida, o esplendor de cada momento. Tal imperiosa necessidade de preenchimento foi, inicialmente tentada das mais variedades de formas insanas possíveis, do que, inevitavelmente só podia propiciar mais caos e confusão ao a já instalados. Era uma matemática insana, uma fórmula formada pela dor do vazio, acrescida de alguma forma de prazer imediato, com seu alivio momentâneo, precedido sempre de dor ao quadrado, quando não, ao cubo. Sempre a mesma insanidade de fazer as mesmas coisas esperando por resultados diferentes. Nunca, ao longo de todos estes anos, me ocorreu com tanta clareza que eu não tinha momentos de vazio, o que tinha era uma profunda e imperiosa necessidade de "esvaziamento" de tudo que não me era natural, de tudo aquilo que permiti, por falta de maturidade, carregar como valores verdadeiros, como necessidades verdadeiras e que ocupavam o espaço da única e real necessidade: uma vivência direta do Ser que nos faz ser, um estado de comunhão com essa Presença que a tudo traz o seu real valor. Olho para o retrovisor de minha tumultuada existência e vejo os caminhos tortuosos nos quais tentei evitar tal experiência de esvaziamento, tal experiência de deserto, tal experiência de solidão, tão necessária para o encontro e conhecimento de si mesmo. Quantas relações vazias, quantas rodas de euforia delirante, as quais, erroneamente, nomeava como amizade, e em nome das quais, me permiti um ajustamento servil. Sempre um prisioneiro em meio de prisioneiros, totalmente desconhecidos de si mesmos, analfabetos do Ser. Quão longa e dolorosa foi a caminhada para chegar ao "sagrado momento de saturação"... Aquele momento em que se percebe lucro onde antes só se enxergava prejuízo. Aquele momento em que se percebe a riqueza contida na expressão, "antes só do que mal acompanhado" — e isso não se refere tão somente as vazias relações, se é que assim posso chamá-las. Refiro-me a visão da necessidade de estar só, psicologicamente, sem aquela imperiosa necessidade de buscar pela experiência de terceiros, só para poder não fazer frente ao próprio deserto existencial, causado por anos e anos de afastamento de si mesmo, afastamento este que foi sendo sistematicamente instalado através da cultura, da formatação mental que chamam de educação, da formatação em série que chamam de curso superior, do encalacramento da mente que chamam de religião, do afogamento do ser que chamam de obrigações sociais. Nunca pude compreender com cada célula de meu corpo, a sabedoria contida na expressão que diz "que é no vazio fértil de um bambu que a flauta conhece a impessoalidade do Som que dá seu som". Me desesperava quando lia nas linhas de vários homens e mulheres que "deram certo", que a resposta está dentro de cada um. Olhava, olhava e olhava e nada encontrava, a não ser, mais vazio e inquietude. A cada tentativa de olhar, mais vazio, mais inquietude não assimilada, não compreendida, trazendo mais desespero por não entender a lógica de tais sentimentos e de que não tem como um "eu", por si mesmo ver a resposta. A resposta foi surgindo sem a consciência desse "eu". Ela foi tomando seu devido lugar que foi, por decênios, ocupado por um monte de lixo cultural, por um monte de condicionamento, por uma insana expectativa de acompanhar e responder a infinidade de "você tem que", "você deve", "você precisa", que soavam das surdas bocas que me cercavam. Tudo isso por medo do ostracismo, pela doentia necessidade de aceitação, pelo medo de ser diferente, de pensar e sentir diferente, pela necessidade de reconhecimento e de um senso de pertencer, mesmo que esse senso de pertencer, contraria-se as minhas mais intrínsecas necessidades. Foi através do cansaço dessa frases, desse amontoado de falas vazias, de encontros destituídos de almas, com essas bocas que falam demais por não ter nada de impessoal a dizer, e também do peso das máscaras que usava para com elas poder me relacionar, que instalou-se a corajosa necessidade de solidão, de distanciamento e de auto-enfrentamento. 

Não tem preço perceber que não existe essa tal coisa que antes erroneamente eu chamava de "vazio"; o o que existe é uma profunda e empírica necessidade de auto-esvaziamento, esvaziamento daquilo que se pensa ser, daquilo que se pensa necessário ser, o esvaziamento desse insano vir-a-ser. Um retorno ao modo da infância, onde não havia tempo, preconceitos, memória, só uma entrega capaz de superar o medo de novas experiências, um estado de abertura constante ao novo. Agora me recordo de uma frase que me foi dita por um homem que foi muito importante em certo período de minha vida. Em sua sabedoria, com seu português simplório que fazia os menos sensíveis dele caçoarem quando da sua ausência, um dia disse-me, sentado no banco dianteiro de meu carro, em frente da pensão em que morava: "Deus é exatamente do tamanho de seu vazio. Enquanto você insistir em colocar algo para preencher tal vazio, esse tão necessário encontro nunca ocorrerá." Naquele período, devido a fragilidade emocional em que me encontrava, por acabar de ter saído da minha "depressão iniciática",  a qual hoje brinco nomeando-a de "Deuspressão", não havia a maturidade necessária para a compreensão da magnitude de tais palavras. Sei que neste momento ele deve estar sorrindo junto comigo. É ao menos curioso perceber como que a natureza funciona, perceber o tempo necessário para que uma palavra possa dar os frutos. É o "eu" que quer resultados imediatos, que se acha sabedor do tempo certo. Havia também uma senhora que sempre me dizia: "As coisas não funcionam no seu tempo; tudo ocorre no tempo de Deus e, o relógio de Deus, não tem ponteiros". 

Quero agora compartilhar da alegria que sinto, por ter sido agraciado pela coragem de abrir mão dessas relações que não me impulsionavam para este auto-enfrentamento. Pela coragem que me foi dada para me entregar a solidão, para fazer frente ao ostracismo, fruto dos medos oriundos da falta de compreensão por parte das pessoas, líderes dos grupos pelos quais passei e que cumpriram muito bem sua real função. Aqueles que me fecharam as portas, sem consciência, foram os mestres que a Grande Vida colocou em meu caminho, a fim de me direcionar para a possibilidade de novos encontros muito mais nutritivos, tão necessários para a manifestação deste estado de bem-estar e unidade interna, desta autonomia e autosuficiência psicológica, que traz consigo, liberdade com responsabilidade e quem sabe, amorosidade.

Nelson Jonas R. de Oliveira

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