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Este blog é apenas uma voz que clama no deserto deste mundo dolorosamente atribulado; há outros e em muitos países. Sua mensagem é simples, porém sutil. É uma espécie de flecha literária lançada ao acaso, mas é guiada por mãos superiores às nossas. À você cabe saber separar o joio do trigo...

6 de outubro de 2011

Por que aceitamos a anormalidade como normal?

O novo rebelde

Olá amigo! Eu espero que você esteja vivendo bons momentos, neste momento em que você se depara com este vídeo. Eu estava aqui nestes meus momentos de ócio, eu estava pensando sobre uma conversa que eu tive hoje com um rapaz que esteve aqui, que veio pegar um serviço. Tivemos uma conversa super legal, foi a primeira vez que a gente conversa assim com um pouco mais de tempo e gostei bastante da cabeça dele, o modo como ele vê a vida. E, num determinado momento de nossa conversa ele falou assim, que ele teve muito problema, como eu também tive, com um pai alcoólatra — todos que veem de uma família disfuncional, que tem algum ente querido com algum problema compulsivo, sabe muito bem o isso significa. E ele estava me falando sobre a alergia que ele tem diante de qualquer vício de comportamento químico e que ele tinha jurado para si mesmo que nunca seus filhos teriam que sofrer o mesmo que ele sofreu com relação a questão do alcoolismo. Enquanto ele falava isso, enquanto ele me contava sua experiência no qual eu me identifiquei — também não tive esse problema da questão do álcool, nunca tive — eu fiquei me questionando o seguinte:

Por que nós não temos a mesma visão de não querer transmitir, transferir para os nossos filhos, para aqueles que estão ao nosso lado, ao nosso redor, para aqueles que entram em contato conosco, os resultados insanos, doentios, conflituosos que temos desse vício de tentar acompanhar o comportamento que a sociedade estipula como sendo o "padrão aceitável"? Por que fazemos isso com nós mesmos? Por que fazemos isso com as pessoas que nos são queridas? Por que insistimos em propagar esse modelo que tem causado tanto estresse, tanto conflito, tanto medo, tanta insegurança, tanta falta de tempo, que tem nos tornado cativos do relógio, prisioneiros do tempo, cheios de compromissos, acreditando em várias "desnecessárias necessidades", necessidades desnecessárias que foram criadas não por nós mesmos mas, por alguém que está por ai controlando toda essa parafernália que nos induz à um estado de consumismo inconsequente? Por que nós insistimos em propagar isso? Por que nós não conseguimos enxergar que isso também é um vício coletivo, que causa tanto mal, ou mais do que os males advindos de outro padrão de comportamento compulsivo? Um modo de vida do qual não sobra tempo para nada, para absolutamente nada... Como, se você não tem tempo, pode fazer qualquer tipo de questão que seja fundamental, que possa  abrir portas para um estado de consciência que leve a um modo de simplicidade voluntária, um modo de vida muito mais leve, muito mais tranquila, muito mais folgada, com tempo para desfrutar da existência "com vida"? Não de uma existência "sem vida" que é o que quase todos nós estamos vivendo! A gente olha e vê pessoas, verdadeiros "mortos vivos" andando pela rua... Quer fazer uma experiência?... Saia da sua casa, pare na saída de uma porta de uma estação de metrô qualquer e acompanhe como que as pessoas saem das escadas...  Dê uma olhada no semblante delas... Dê uma olhada no movimento dos corpos delas... Veja se ali tem vida... 

Por que nós aceitamos isso como normal?... Por que não questionamos nada?... Aliás, o que é que nós estamos buscando?... Será que as pessoas se perguntam isso: o que é que elas estão buscando?... Você não sai da sua casa com a chave do carro e sai para qualquer lugar, você tem que ter alguma direção, algum lugar... Será que as pessoas realmente sabem o que estão buscando? Para onde é que aponta o coração? 

Eu disse para esse rapaz, que uma das coisas que, eu venho já num processo, há muitos anos, de questionamentos de valores, de conceitos, de padrões de comportamento, mas que em especial, uma das experiências que eu tive que mudou muito, drasticamente meu modo de ver a vida, foi acompanhar a morte de meu pai... Fazer uma análise de como foi a vida dele, uma vida de total sofrimento, já vindo de uma família completamente comprometida, profundamente disfuncional, sem intimidade nenhuma entre os membros, muito ressentimento, muita raiva, muita inveja... Tudo isso, transferindo para os outros... Perceber uma vida inteira cheia de medo, de angústias, de incertezas, de conflitos... E estar chegando o momento de "passagem" sem estar consciente, sem estar preparado, sem estar se sentindo livre, leve e solto para isso. Fiquei me questionando: de que vale ficar correndo atrás de tanta coisa que as pessoas colocam como necessárias se você, nem ao menos tem tempo para desfrutar dessas coisas que você coloca como sendo necessárias. Ao contrário, essas coisas que você coloca como sendo necessárias acabam tornando você um escravo delas, você vive em função delas... Vive para consegui-las e depois vive para mantê-las, depois para não perde-las ou vive para substituí-las... Um ciclo vicioso que rouba o tempo!... Hoje é até chique!... Uma das frases corrente é: "Tô na correria!"... "Pô, tá mó doideira!"... "Pô, tá louco"... Ninguém tem tempo para nada!

Eu virei para esse rapaz e perguntei para ele, se ele se lembrava de como é que deram o nome, como apelidaram o "dicionário"?... Ele parou, pensou um pouquinho, — eu pensei que ele não ia ter essa resposta —, mas ele me falou: 

— "Pai dos Burros!"... 

— Então, você já parou para pensar, para meditar, por que é que deram o nome de "Pai dos Burros" para o dicionário? 

Ele olhou...

Não!

— Uma pessoa que tem conhecimento da palavra, pode ser facilmente manipulável?

O engraçado é que você  ouve nas religiões que a pessoa vai ouvir, vai buscar pela "palavra", pela palavra de Deus... Uma pessoa que tem o conhecimento da palavra, fica muito difícil de ser manipulada. Então, é muito fácil você colocar o nome de "Pai dos burros" porque todo mundo vai se afastar desse livro, desse livro que é fundamental. 

Eu fico vendo as pessoas que vem aqui, que fazem serviço comigo, estão sempre adrenadas, sempre apressadas, com aquela coleira eletrônica que é o celular, os rádios... Não tem tempo para nada!... Não dá para respirar um minuto!... E as pessoas, é interessante como que as pessoas olham para uma pessoa que se permite o estado de ócio... É interessantíssimo ver isso!... As pessoas não veem beleza no ócio... As pessoas se sentem culpadas de estarem no ócio... Eu me lembro muito bem quando optei por isso, como que eu me sentia mal ao ver a maioria das pessoas em volta de mim, correndo para cima e para baixo e eu ali, podendo sentar embaixo de uma pitangueira, com um bom livro do Krishnamurti, do Huberto Rohden, do Joel Goldsmith, e ali ficar meditando sobre a existência, sobre uma existência cheia de conflitos. 

E ai eu perguntei para ele, se ele tinha algumas vez aprendido, se foi incentivado a olhar as palavras, dividir as palavras, ver a composição das palavras, para entender a riqueza de conhecer a palavra... Eu perguntei para ele sobre a palavra "negócio"... Se ele já tinha olhado para a composição dessa palavra: "negar o ócio"... Negócio: negar o ócio!... Por que é que se paga por um negócio? Por que é que se paga caro por um negócio que demanda muito tempo? Porque é profundamente mais importante o estado de ócio! Só no estado de ócio é que perguntas fundamentais, percepções fundamentais, percepções essas que levam ao "desvincular" desse padrão de comportamento acelerado e estressado que todos vivem a nossa volta e dos quais rouba o tempo necessário para o desfrute de tudo que é realmente essencial. Por que da palavra "compromisso"?... A omissão do estado do ócio... Se não tem esse estado de ócio, como meditar, como pensar, como olhar com propriedade para alguma coisa? De que jeito? Nós não fomos ensinados, incentivados a dar boas vindas ao estado de ociosidade, ao contrário, é chique falar que você está na correria, que você é um homem ocupado, que você é um homem que só vive para o trabalho, como trabalha... Até a palavra "empregado"... Estar pregado num determinado lugar... Você tem que funcionar!... 

Até essa questão do emprego mesmo, é bastante interessante!... Tem um senhor que vem aqui direto conversar comigo, o Nestor, ele vive falando para mim que, na época de sua infância, o lance era arrumar um emprego!... Se arruma-se um emprego de carteira assinada, a pessoa estava garantida! Então, a carteira de trabalho passou a ser uma coisa profundamente valiosa... Você ser autônomo, parece que não tem beleza nisso... Parece que nunca teve mesmo essa coisa do incentivo para você descobrir qual é a sua real vocação... Eu vejo, é muito interessante, converso isso com muita gente, vejo muito isso acontecer, você não é incentivado para buscar algo que realmente toque seu coração... Você é incentivado a buscar por algo que "dá dinheiro", que "dá bastante dinheiro"... Você fazer algo que vá te fazer feliz, que nesse feliz você tenha que ter uma vida de simplicidade, isso não conta, o que conta é você ter condições de ter vários "bens", "propriedades", conseguir aquilo que a sociedade coloca como sendo "r-e-a-l-i-z-a-ç-ã-o"... A realização está sempre no externo!... Está sempre no adquirir, está sempre no consumir... Não importa se através desse consumir você vá se consumindo direto, consumindo a si mesmo direto!... O lance é estar empregado!... Você ser um freelance parece que não conta muito, não é muito seguro, não é muito "respeitável", não é muito aceito... Você não está enquadrado nessa rotina acelerada, apertada, que é um absurdo... É um absurdo como todos aceitam isso sem o mínimo questionamento... Vamos aceitando!... Vamos empurrando a existência com a barriga!... Não vamos olhar para nada disso! E o engraçado: só se começa a olhar para isso quando vem uma "crise", quando vem a crise, quando vem a depressão, que eu brinco e chamo de "Deuspressão", ai começa o questionamento, caso contrário, você vê todo mundo, sonâmbulos acelerados... Altamente acelerados... Um subindo em cima do outro... Uma guerra social violenta para defender um "micro espaço", para defender migalhas, migalhas sem qualidade, sem intimidade, sem autenticidade... O que conta hoje é "copiar"... Tudo é cópia!... A cópia barata é que tem valor, é que conta!... Isso é muito interessante!

Outra coisa que eu tenho visto e que é muito interessante ver, é como as coisas vão mudando... Essa questão da escrita, da escrita na Internet... Você entra dentro da casa de alguém que você não conhece e entra lá e começa a discutir com a pessoa a maneira como que ela dispõe, o estilo e o modo como ela disponibiliza os seus pertences?... Não, não é mesmo?... Mas na internet tem isso: as pessoas podem se esconder atrás de um desenho qualquer, de um nickname qualquer, ou mesmo anonimamente, entrar dentro do seu espaço, que você criou, para dividir as suas coisas, os seus pensamentos, que muitas vezes você escreve para se auto-esclarecer, de si mesmo, e ai a pessoa entra lá e começa a tecer um monte de desaforos, um monte de críticas, devidamente protegida no anonimato... É tão interessante!... Começa a criticar tudo o que você está vivendo, tudo que você está... Se na vida real já é difícil "Viver e deixar Viver", nesse mundo da internet então é inacreditável!... Parece que todo mundo tem uma receitinha de como é que você "tem que" viver... O que é "correto"... Igualzinho o que a gente aprendeu na escola, o que aprendeu na família... O mesmo padrão!... Não que a crítica não seja interessante! Mas uma critica construtiva, aberta, responsável em que se dá a conhecer, uma crítica que leve a se conhecer... Mas é bem compreensível: é fácil criticar! Aliás, é a única ação que resta para quem não tem em si mesmo nenhuma ação criativa... É fácil criticar poesia, difícil, é fazer a poesia! É fácil criticar tudo! Cara, não tem preço ver todas essas coisas!... Não tem preço!

Outro lance que eu acho muito interessante também, que eu fico me questionando: eu fico vendo várias e várias pessoas sofrendo, sofrendo, mas insistindo numa auto-suficiência neurótica, resistindo ao novo, resistindo a uma abertura para ouvir algo que não esteja dentro do arquivo do conhecimento dela... A pessoa está tão complicada que não consegue perceber que está defendendo o que? Se aquele padrão de comportamento dela é que leva ela a um estado de conflito constante... Por que essa tendência neurótica de se apegar ao conhecido? Por que não se aventurar ao "Aberto"?... Por que não exercitar uma escuta atenta, destituída de qualquer defesa, de qualquer barreira, de qualquer resistência... Até mesmo, porque se ouvir, vê se ali é o falso ou o verdadeiro... Fica fácil!... Não! As pessoas preferem continuar batendo a cabeça! Insistindo nos achismos, no tal do "livre-arbítrio"... Muito interessante isso!

Nelson Jonas Ramos de Oliveira


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