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Este blog é apenas uma voz que clama no deserto deste mundo dolorosamente atribulado; há outros e em muitos países. Sua mensagem é simples, porém sutil. É uma espécie de flecha literária lançada ao acaso, mas é guiada por mãos superiores às nossas. À você cabe saber separar o joio do trigo...

1 de fevereiro de 2012

A base do silencioso sofrimento

O essencial é saber ver, mas isso (triste de nós que trazemos a alma vestida!),
isso exige um estudo profundo, uma aprendizagem de desaprender.

Eu procuro despir-me do que aprendi.
Eu procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,
e raspar a tinta com que me pintaram os sentidos;
desembrulhar-me e ser eu.

Alberto Caeiro (Fernando Pessoa)

Para a grande parte dos seres humanos, na infância não houve o encorajar da curiosidade, do senso de questionamento e investigação, livre de qualquer tipo de autoritarismo ou violência psicológica e até mesmo física. Ao contrário, sempre houve um cartilhado esforço ao inquestionável ajustamento ao tradicional, ao estabelecido. Para grande parte dos seres humanos — salvo em raras exceções — o ambiente natural sempre foi destituído de uma atmosfera de real afeição, felicidade e consideração humana. Ao contrário, o que pairava no ar era medo, desconfiança, comparação, vergonha, infelicidade, falta de cumplicidade e a imposição de arcaicos, disfuncionais e abusivos sistemas de crença, o que acabou por impedir o salutar desenvolvimento da livre expressão e da  franqueza emocional. A excessiva exposição a esse ambiente tóxico acabou por adulterar a sensibilidade e, consequentemente, a capacidade de confiança nos relacionamentos. Instalou-se a perda do senso de segurança em si mesmo e nos demais ao redor, o que gerou um modo inseguro e dependente de se relacionar, onde o medo, o ciúmes, a desconfiança, a comparação e não o amor se fizeram a base de quase todas as relações.

A formatação para obedecer, para se conformar, para aceitar tudo sem a menor possibilidade de questionamento, impediu a capacidade do exercício de perguntas fundamentais e do livre raciocínio, isento de qualquer forma de influência. Em resultado disso, boa parte dos seres humanos acabou desenvolvendo uma "profunda alergia" à menor expressão de posicionamento autoritário. Nesse disfuncional modelo de educação — o qual nada tem da essência da educação — através da constante imposição do medo, adulterou-se o importantíssimo desenvolvimento emocional, o que acabou dando margem ao senso de "não pertencer" ao ambiente natural e a família de origem, o que hoje é reconhecido como "síndrome de estrangeiro". Esse senso de não pertencer, de não ser bem vindo, impediu a ambientação, o sentimento de estar 100% a vontade, livre do medo da recriminação, do castigo, da violência ou da exposição à vergonha tóxica. Em raras exceções, a sensação de insegurança não  foi uma constante. Como resultado, deu-se o desenvolvimento de um olhar de desconfiança diante das pessoas psicologicamente significativas, o que sempre impediu a comunicação direta dos pensamentos e sentimentos. Por não sentir os pensamentos e sentimentos respeitados e honrados, desenvolveu-se a rebeldia e o desrespeito, os quais sempre foram expostos as autoritárias — e na maioria violentas — tentativas de abafamento e não a um convite para a escuta aberta, atenta e amorosa que aponta para o encontro, a compreensão e a comunhão. Ao invés de respeito e consideração, o que existia era o medo. O medo e a imposição foram a base da criação. O medo, além de impedir o desenvolvimento da sensibilidade aos sentimentos das pessoas e à natureza, transformou a maior parte dos que a ele foi excessivamente exposto, em seres frios, reativos, calculistas, profundamente egoístas, retraídos, esquivos, resistentes a qualquer tipo de sugestão e incapazes de vivenciar, de bom grado, períodos de solidão. Em resultado disso, não houve o desenvolvimento da capacidade de amar, de forma incondicionada, à tudo e à todos e, sem o desenvolvimento da capacidade de amar, perdeu-se também as demais qualidades do amor que são a humildade, delicadeza, consideração, paciência e cortesia. Em resultado disso, ao invés do livre comungar, instalou-se o ambicioso e inconsequente consumismo, o qual acabou por gerar uma incontável rede de compulsões, as quais além de impedir a atenção plena e o reto pensar, enclausurou a muitos num poderoso círculo vicioso, intercalado pelo imperioso impulso para retroalimentação do mesmo e o impotente impulso para conseguir detê-lo. Em função disso, muitos acabaram se tornando escravos mantenedores de instituições, religiões e pessoas que prometiam por felicidade e liberdade.
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