Aviso aos navegantes

Este blog é apenas uma voz que clama no deserto deste mundo dolorosamente atribulado; há outros e em muitos países. Sua mensagem é simples, porém sutil. É uma espécie de flecha literária lançada ao acaso, mas é guiada por mãos superiores às nossas. À você cabe saber separar o joio do trigo...

3 de fevereiro de 2012

A difícil arte de comungar

De fato, nunca estamos em real comunhão com nada, nunca estamos em comunhão com a totalidade dos sons, com a natureza, com outro ser humano. Nunca há a total dissolução entre o observador e aquilo que ele tenta observar sem que ocorra a interferência do pensamento. Em toda tentativa de comunhão, sempre permanece um hiato, um espaço que acaba mantendo aquilo que vem sendo chamado de "ilusão de separatividade". A incapacidade de comunhão cria a sensação de separatividade, a idéia de um "eu" e um "outro", um "ouvidor" e os "sons", um "eu" e a "natureza". Não se dá o diluir do observador em nada porque o pensamento sempre interfere com suas imagens, seus monólogos, suas buscas por contendas e suas respectivas emoções. Comunhão — ser um com — comungar — um ar comum com — com a presença do "eu", impossível. No entanto, tudo é um convite para a comunhão, para a meditação, quando não há a interferência do pensamento criando "condições"... O latido do cão diante do menor movimento externo, a recriminação de "seu dono" para que este silencie, tudo é um convite para a meditação.

Não sei se você já vivenciou isso, tentar estar em total comunhão com a totalidade dos sons que se manifestam, se apercebendo paulatinamente até que não existam mais sons específicos, mas apenas, a manifestação do som — nada de som interno ou externo. E, indo um pouco mais fundo, além dos sons, estender para os movimentos das folhas das árvores, o balanço de seus galhos, as cores das flores, do céu, os formatos das nuvens com os raios do sol vindo por trás delas, o pedaço de papel levado pelo vento juntamente com as folhas secas, o casal de adolescentes, com seus uniformes escolares, sentados na calçada, totalmente descompromissados, em suas trocas de sorrisos e carícias. Em geral, estamos tão envolvidos em nossos movimentos egocêntricos, tão mecânicos, automatizados que não percebemos, não nos damos conta de nada disso, nada do que acontece — a todo momento — em nossa volta e, com propriedade. Por não vermos nada com propriedade, , por não ouvir nada com propriedade, não percebemos "graça" em nada, uma  vez que, uma mente egocentrada não consegue ver graça em nada que não seja, por ela, produzida através da imitação. Uma mente egocentrada não consegue ver beleza no que é natural, uma vez que, de beleza e naturalidade, nada sabe. A mente egocentrada se identifica apenas com a complexidade geradora de conflitos e intermináveis problemas, através dos quais, pela ignorante identificação, mantém sua idéia de importância e continuidade. 

Não aprendemos a exercitar a linguagem universal do silêncio — o silêncio da mente, do corpo, dos sentidos — em resultado disso, vivemos em constante desassossego. Não aprendemos a vivenciar momentos de solidão — a solidão que nos coloca frente à frente com nós mesmos, com nossa realidade interna — em resultado disso, fizemos da solidão, motivo de sofrimento. Como resultado dessa incapacidade de viver com a solidão, não tomamos consciência de que nunca estamos sós, não tomamos consciência de que, uma Presença nos habita — sempre em chamas — no centro do Ser que somos, que uma vez, por leve que manifesto, coloca em xeque a realidade daquilo que pensamos ser. 

O movimento da natureza, em raras exceções, não é silêncio. O movimento do que foi criado pelo pensamento, em raras exceções, não é barulho. Em vista disso, para este que agora escreve, se existe uma religião, essa se faz presente, pelo silêncio. Ademais disso, só, ilusão. 
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