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Este blog é apenas uma voz que clama no deserto deste mundo dolorosamente atribulado; há outros e em muitos países. Sua mensagem é simples, porém sutil. É uma espécie de flecha literária lançada ao acaso, mas é guiada por mãos superiores às nossas. À você cabe saber separar o joio do trigo...

2 de julho de 2012

Sobre o reduzido alcance do pensamento

Sob a transparência do céu claro, luzes e sombras tremulavam no meio do pequeno bosque. Era inesgotável o fluxo da meditação, àquela hora matinal, em que o sol estava ausente e não havia ainda carros subindo a ladeira. O fato de ter suas raízes na memória determina o reduzido alcance do pensamento. Ao desejar transcender seus próprios limites, ele se torna meramente especulativo, fantasioso e destituído de significado. É vedado ao pensamento descobrir algo além de seus limites temporais. E, ainda que decifre seu próprio enigma, ele é incapaz de penetrar nos mistérios da meditação. Esta para existir, depende do findar do pensamento. O sol projetava sombras sobre o muro, os carros trafegavam ladeira acima, e dentro de instantes os operários estariam assobiando e cantarolando sobre os andaimes do edifício em construção do outro lado da rua.
O cérebro é um instrumento de surpreendente sensibilidade. Incansável em sua atividade de captar, registrar, interpretar e acumular impressões, ele não para jamais de funcionar. Herdado do animal o instinto de sobrevivência e a busca de segurança física, o cérebro tomou-os com base de todas as suas atividades e projeções, tais como deus, a virtude, a moral, a ambição, os desejos, as exigências e os ajustamentos. Por ser extremamente sensível, o cérebro, com sua capacidade de pensar, passa a dedicar-se ao cultivo do tempo, do passado, do presente e do futuro. Com isto, ele tem a oportunidade de adiar a ação, de buscar a satisfação, de perpetuar-se através da busca do ideal e do preenchimento. Daí nasce a dor, a fuga na crença, no dogma, no misticismo, em toda atividade e nas múltiplas formas de entretenimento. A morte e o medo estão sempre presentes, obrigando o pensamento a buscar alívio e refúgio nas crenças, na esperança e nos conceitos, racionais ou irracionais. A verbalização e as teorias adquirem grande importância, servindo de base ao cotidiano e suscitando sentimentos e pensamentos condicionados. Por mais que se julgue profundo, o pensamento atua no âmbito bem estreito da vida. Seja ele hábil, seja experiente ou erudito, o pensamento é superficial. Como parte do todo, o cérebro, com sua incessante atividade, valorizou-se demais perante si mesmo e dos restantes dos fragmentos. Por serem a desintegração e a contradição suas características essenciais, é ele incapaz de perceber o todo. Acostumado a reagir e a pensar em termos de opostos, o cérebro vive até hoje no conflito, na confusão e no sofrimento.
O pensamento não pode compreender a vida integral. Essa compreensão nasce da absoluta imobilidade do cérebro e do pensamento, sem estar ele adormecido, embotado, pela disciplina e compulsão, ou hipnotizado. Extraordinariamente sensível, o cérebro pode permanecer imóvel e quieto sem que isto implique perda de sensibilidade ou capacidade de penetração. Surge o insondável mistério do incognoscível quando o tempo e a medida cessarem de existir.
Krishnamurti — 13 de outubro de 1961
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