Aviso aos navegantes

Este blog é apenas uma voz que clama no deserto deste mundo dolorosamente atribulado; há outros e em muitos países. Sua mensagem é simples, porém sutil. É uma espécie de flecha literária lançada ao acaso, mas é guiada por mãos superiores às nossas. À você cabe saber separar o joio do trigo...

25 de fevereiro de 2013

Relatos da manifestação da Inteligência Criativa Amorosa

17 de julho

Após escalarmos a íngreme ladeira arborizada de uma montanha, fomos sentar em um banco. Inesperadamente, aquela sagrada benção nos atingiu; embora nada disséssemos, o companheiro também a sentiu. Assim como muitas vezes inundou o quarto, agora, parecia cobrir toda a encosta e o vale que se estendia para além das montanhas. Ela estava em toda parte. Era como se o espaço não existisse; o que se encontrava distante, o vasto desfiladeiro, os picos cobertos de neve e a pessoa sentada no banco logo desapareceram. Não havia um, dois, ou muitos, mas apenas aquela imensidão. O cérebro já não reagia, era apenas um instrumento de observação; via não como um cérebro pertencente a determinada pessoa, mas como um cérebro não condicionado pelos limites do tempo e do espaço, como a essência de todos os cérebros.

A noite estava calma e o processo havia diminuído de intensidade. Ao despertarmos pela manhã, aquela experiência teria durado talvez um minuto, um hora, ou uma eternidade. Experiência transmitida não é uma verdadeira experiência; aquilo que tem continuidade deixa de ser experiência. Ao acordarmos, a imensa chama da atenção, da plena consciência e da criação, ardia furiosamente bem no íntimo, na imensurável profundeza da mente total. A palavra não é a coisa; o símbolo não é o real. O fogo que arde na superfície da vida passa, apaga-se, deixando atrás de sai tristeza, cinzas e lembranças. A tal fogo dá-se o nome de vida, mas não é vida. Isto é decadência. O destruidor fogo da criação é que constitui a vida. Nele não há começo nem fim, não há o ontem nem o amanhã. É uma realidade, e nenhuma atividade superficial jamais o descobrirá. O cérebro deve morrer para que surja esta vida.

19 de julho

Ontem à tarde, o processo tornou-se mais doloroso. Ao anoitecer, a sagrada benção surgiu inundando o quarto. A noite foi calma, embora a pressão e a tensão estivessem presentes, como o sol encoberto pelas nuvens; de manhã bem cedo, o processo recomeçou.

Parece que acordamos apenas para registrar dada experiência; isto tem acontecido frequentemente, desde o ano passado. Despertamos esta manhã com um vivo sentimento de alegria; ele surgiu-nos ao acordarmos; não era uma coisa do passado, mas que estava acontecendo. Ela tinha existência própria, não era provocada pela própria pessoa; aquela avassaladora energia penetrava e fluía por todo o organismo. O cérebro não tomava parte naquilo, mas, apenas registrava, não como lembrança, porém, como um fato real que estivesse ocorrendo. Por trás deste êxtase parecia haver imensa força e vitalidade; não se tratava de um sentimento, nem de uma sensação ou emoção, pois era tão sólido e real como aquela torrente que jorrava da montanha, ou o pinheiro solitário, na encosta verdejante. Toda sensação e emoção provêm do cérebro, mas não o amor, e daí a presença daquele êxtase. É com a maior dificuldade que o cérebro pode evocá-lo.

De manhã cedo sentimos uma benção que parecia cobrir a terra e encher o quarto. Com ela, uma consumidora tranquilidade, um total e envolvente silêncio.

28 de julho

Caminhávamos, ontem, por nossa estrada preferida, paralela ao ruidoso regato, no estreito vale de pinheiros escuros, campos floridos, e, ao longe, a imponente montanha, coberta de neve, e uma queda d’água. Tudo era enlevo, paz, frescor. Ali, enquanto andávamos, surgiu aquela benção sagrada, algo que quase podíamos tocar, e, interiormente, passávamos por transformações. O encanto e a beleza daquela noite singular não pertencia a este mundo. O imensurável sobreveio, propiciando um clima de paz.

Esta manhã, ao despertarmos, constatamos que o processo se intensificava; vinha por detrás da cabeça, avançando como uma flecha, com aquele som peculiar quando investe cortando o ar; era uma força, um movimento sem direção. Uma atmosfera de imensa firmeza e inacessível “dignidade” se fazia sentir. Junto com a austeridade que o pensamento não pode conceber, sentíamos uma pureza de infinita suavidade. Mas, isto são palavras, meras palavras, que jamais descreveram o real. O símbolo nunca é a realidade e em si mesmo nada exprime.

O processo perdurou toda a manhã, e uma taça, sem dimensões, parecia repleta, a ponto de transbordar.       

Krishnamurti – Diário de Krishnamurti – Cultrix

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