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Este blog é apenas uma voz que clama no deserto deste mundo dolorosamente atribulado; há outros e em muitos países. Sua mensagem é simples, porém sutil. É uma espécie de flecha literária lançada ao acaso, mas é guiada por mãos superiores às nossas. À você cabe saber separar o joio do trigo...

1 de agosto de 2011

Nem submissão incondicional, nem rebelião impulsiva

.....O legitimo propósito da psicologia, especialmente quando especializada no campo da saúde mental, é o de libertar o homem de suas tensões internas, por ajudá-lo a compreender quais sejam as causas dessas mesmas tensões. A psicologia procura libertar o espírito humano de um estado de dependência em relação ao pensamento imaturo, permitindo, assim, àquele, que realize suas próprias vitalidades. Procura auxiliar o homem a enfrentar a realidade e seus inúmeros problemas e intenta fazer com que cada um reconheça tanto suas limitações quanto suas probabilidades de desenvolvimento. Tem ela como escopo preparar indivíduos maduros, capazes de viver em liberdade e de restringir voluntariamente a própria liberdade, sempre que isso seja necessário para o bem da maioria. Baseia-se na premissa de que o homem que se conhece a si mesmo está em condições de ser o senhor de sua própria vida, em lugar de ser um mero títere, quer de seus próprios impulsos inconscientes, quer de um tirano dotado de perversa cobiça de poder.
.....Todo homem passa por um estágio de desenvolvimento em que é altamente suscetível ao totalitarismo. Isso ocorre usualmente na adolescência, quando o jovem púbere toma consciência de sua própria personalidade — a autoridade que tem dentro de si mesmo. Se não aceita essa responsabilidade, pode vir a procurar, fora do lar paterno, um chefe poderoso. Numa idade anterior — na infância — estabelecem-se padrões mais inconscientes, os de compulsão e de obediência automática. Com o advento daquele novo senso de personalidade distinta e individual, começa o jovem a contrapor-se à autoridade dos adultos que anteriormente lhe orientavam a vida.
.....É por um processo penoso que se toma consciência dessa entidade chamada ego, pessoa ou eu. Não é por acaso que a melancolia, está tradicionalmente ligada à adolescência. O processo pelo qual passamos a ser um indivíduo autônomo e que se desenvolve por si mesmo supõe afastamento da esfera da segurança da família. Para que o adolescente realize sua democracia interior, precisa afastar-se do ambiente protetor. Ao fazer isso, ele não só se intoxica com a ideia de desenvolvimento e emancipação, mas fica também tomado por uma impressão de medo e isolamento. Ingressa num mundo novo em que, daí por diante, tem que assumir madura responsabilidade por seus próprios atos. Nessa ocasião, pode tornar-se presa fácil da propaganda totalitária. Uma aversão pessoal pelo próprio desenvolvimento pode levá-lo a desertar da luta pela maturidade pessoal.
.....Este problema se apresenta de modo particularmente agudo na sociedade ocidental, não apenas por causa da verdadeira batalha política-ideológica que enfrentamos, mas também porque os nossos processos de educação acentuam essa dificuldade. Enquanto que, nas sociedades primitivas, desde muito cedo se atribui à criança certa porção de responsabilidade social que vai aumentado gradualmente, no nosso meio, a cultura da classe média mantém o educando completamente segregado no mundo da criança, do lar e da escola, mergulhando-o, depois, precipitadamente, no mar da vida,  para submergir ou sobrenadar. Nesse ponto são muitos os jovens que se esquivam de tal prova. Muitos rejeitam essa liberdade que traz consigo tantos encargos e tamanho isolamento. Dispõem-se a restituir, em troca de uma permanente proteção dos pais, a liberdade que receberam, ou, ainda, prontificando-se a colocar essa mesma liberdade aos pés de ideologias políticas ou econômicas que, de fato, nada mais são do que representações deslocadas de pai e mãe. 
.....Infelizmente, não é por render a outrem a própria individualidade que o jovem fica protegido contra o medo e o isolamento. A realidade do mundo exterior absolutamente não se altera em consequencia da escolha que fez. Por isso, manifesta-se, no jovem que deposita sua liberdade nas mãos de novas representações de pai e mãe, um estranho sentimento dualista de amor e ódio, docilidade e rebelião, submissão e ódio. Às vezes, decididamente se inclina diante da autoridade e da tirania; outras vezes, quase sempre inesperadamente, tudo nele é revolta contra o chefe que ele mesmo escolheu. É esse um dualismo sem termo, pois que um dos lados de sua natureza está continuamente procurando ultrapassar os limites que lhe foram impostos pelo outro, o lado submisso. Quem não consegue realizar a própria liberdade só conhece dois extremos: a submissão incondicional e a rebelião impulsiva.
.....Inversamente, o indivíduo bastante forte para entregar-se à maturidade do adulto ingressa numa nova forma de liberdade. É uma liberdade realmente ambígua, pois que supõem a responsabilidade de tomar decisões sempre novas e de enfrentar renovadas incertezas. As fronteiras da liberdade não são a anarquia e o capricho, de um lado, e as regras rígidas e sufocantes, do outro.

Joost A.M. Merloo

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