Todos dormem, upload feito originalmente por NJRO.
A mente tenta constantemente com seu conteúdo mecânico, automático, conteúdo este que é todo o depositário da memória, com seu acervo de experiências, conhecimentos, vivências, causar a necessária identificação para a instalação de conflitos separatistas, conflitos estes através dos quais a mente consegue o alimento necessário para sua dominante continuidade e permanência. Nesse estado de permanência, nesse estado de identificação mental, nos mantemos em constante estado de desatenção, num estado parecido ao sonambulismo, estado este que é a base de toda limitação, de toda fragmentação, de toda ilusória identificação, vivemos em constante estado de dispersão e de identificação com os mais variados tipos de ilusão.
Desde a infância somos educados a identificar como sendo nossa real natureza, aquilo que pensamos, aquilo que de forma totalmente inconsciente e automática, apresenta-se em nossa mente, sem ao menos precisar de nosso convite. Como nunca fomos educados a observar os conteúdos da mente, devido a total identificação com a mesma, desenvolvemos uma instantânea conduta reativa emocional. Esta conduta reativa emocional instantânea é o gatilho de toda manifestação conflituosa, tanto interna quanto externa. Isso é natural porque fomos educados para reagir, para buscar pelo controle, para tomar uma atitude qualquer, para "não deixar quieto", fomos educados para resistir e não para observar, tudo é possível, menos meditar naquilo que se passa na mente viciada. Fomos educados para acreditar que somos a nossa mente e, por acreditarmos nessa ilusão, passamos a maior parte de nossa existência, sem vida, totalmente inconscientes de nossa real natureza. Nossa mente viciada nos torna mecânicos, dispersos, prisioneiros de constantes devaneios, devaneios em formas de projeções, de conjecturas, de lembranças. Não fomos educados para dar a devida atenção ao momento presente, ao agora, ao contrário, fomos educados a valorizar o passado morto e a nos manter sempre preocupados com as futuras situações, a manter os olhos sempre voltados para as conjecturas do futuro. Nessa constante viagem no tempo, perdemos boa parte de nossa energia vital criadora, nos tornamos letárgicos, sonâmbulos, distraídos de nosso estado de ser, seja interno como externamente. Não fomos educados para estar 100% presentes, no agora, a estar holisticamente presentes nas situações que se apresentam. Em vista dessa nefasta educação desenvolvemos uma profunda facilidade, uma forte tendência para a dispersão, para a distração e nem precisamos de fatores externos para que essa dispersão ocorra, bastam os conteúdos dos monólogos mentais, bastam a nossa mente a influenciar em nosso inquieto corpo.
Por não termos sido ensinados, iniciados nessa importante prática do contato consciente com esta presença, presença esta que é a nossa real natureza, nunca estamos realmente presentes nas situações que se apresentam. Não fomos incentivados, não fomos iniciados, não fomos educados na prática da auto-investigação, na observação dos conteúdos da mente, não fomos direcionados para a meditação. Porque se assim o fossemos, desde a mais tenra idade, seríamos um "problema para o sistema", seríamos perigosos diante do ilusório padrão de vida coletivamente incentivado. Ao contrário, somos incentivados a seguir o pensamento tradicional, a segui-lo sem o menor espaço para possíveis questionamentos. Aliás, fomos ensinados a acreditar que que o minimo questionamento diante do que é tradicional é sinal de rebeldia, rebeldia esta que deve ser abafada, que deve ser silenciada em nome da manutenção e continuidade de toda forma de zona de conforto estagnante e corruptiva. Desse modo, toda rebeldia inteligente é indevidamente combatida com toda forma de rebeldia destituída de verdadeira inteligência amorosa e quântica, quântica no sentido de fecundação, fecundação qualitativa..
Sem a presença desse estado de ser meditativo, somos vitimados constantemente por ansiedades, medos, angústias, preocupações, projeções, reações emotivas inconscientes e, por causa dessa inconsciência reativa, para escaparmos do resultante estado doloroso de sofrimento psicológico, alimentamos várias formas de doentias dependências psicológicas, dependências essas que limitam ainda mais nossa capacidade de testemunhar o que é real. Enquanto nosso corpo caminha numa direção, nossa mente voa em várias direções opostas, o que acaba criando em nós, um constante estado de conflito. Somos vitimados através das mais variadas formas de compulsão, sendo, entre elas, o consumo inconsciente e inconsequente uma das formas que se faz mais comum e presente. Em resultado, consumimos sem comungar. Nos tornamos viciados em buscar fora alguma forma de alívio momentâneo para a insuportável dor do "não ser", da insuportável dor causada pelo total desconhecimento de nossa real natureza. Nesse triste estado de ser, tudo que é desnecessário é visto como urgentemente necessário.
Demora muito para que se instale a percepção de que o pensamento é um vício que insiste em nos roubar o agora, o presente instante, funcionando sempre com suas projeções no tempo e espaço, com seu mecanismo acelerado, mecânico, com seus filmes de terror ou de prazer, filmes esses que nada tem a ver com a nossa realidade. Sem a percepção momento a momento deste viciado processo mental reativo, não há como ocorrer o espaço necessário para a manifestação de algo que vá além dos limites do conhecido, algo capaz de um curativo poder superior a toda forma de turbulência mental.
É natural que no início dessa prática da observação neste estado de presença, o pensamento passe a intervir de forma mais violenta do que costumeiro. Aqui se instala quase sempre uma grande confusão. Aqui se faz muito necessário um estado de paciente e amorosa atenção com nós mesmos, para não cedermos ao vício reativo emocional, vicio esse pelo qual tomamos posturas indevidas, que aparentemente se mostram como solução, mas que em pouco tempo se mostram como nova forma de conflito.
Esse é segundo a minha experiência, um dos estágios mais delicados nesse processo de massacre do que é irreal, massacre que ocorre dando abertura para um estado de cansaço, cansaço este que causa a rendição, a rendição necessária para a manifestação libertadora de nossa real natureza.
Nelson Jonas R. de Oliveira