O ego, construção criada pela psicologia e constituido básicamente numa série de reações e defesas, se estabelece durante a infância e a primeira infância Esta construção interpreta a realidade segundo sua visão exclusiva e cria a função de tentar manter essa visão em funcionamento a todo custo. Não só chega a acreditar ser iluminado (como se o ego soubesse o que é a iluminação), como que acredita saber tudo. O ego presume saber quem sou, quem é você, o que é verdadeio, o que é falso, o que é o sentimento, o que é amor e o que é a verdade. Chega até a supor que ele constitui nossa verdadeira identidade. O ego é presunçoso e se alimenta de presunções.
A maioria dos seres humanos estam identificados com seu ego. Estar identificado com o ego quer dizer que o que acreditamos ser está unido inseparavelmente com o mecanismo egóico que funciona dentro de cada um de nós. Significa que não há separação perceptível entre esse mecanismo e quem pensamos que somos "nós". Como ira se mostrando com clareza ao longo do livro, este "ego" é um mecanismo muito poderoso e altamente persuasivo. Na maioria de nós, é ele quem guia o show de nossas vidas. É simultaneamente o diretor, o narrador, todos os atores e ol crítico. Quer dizer, o ego dirige o espectáculo até que passe a fazê-lo quem realmente somos. Esta troca de ser dirigido pelo ego a identificarmos com aquele que realmente dirige o espectáculo constitue o processo da vida espiritual autêntica.
Para se acreditar iluminado há que pensar que se sabe o que é a iluminação e quais são suas implicações. Se bem que a verdadeira iluminação existe, o faz totalmente aparte do contexto do ego e do terreno das presunções. O problema de se equivocar a respeito da própria iluminação é que afeta negativamente ao impulso pessoal diante da realização. Em todo ser humano há um desejo de evoluir, um desejo de Deus, da Verdade — não importa o nome que lhe damos. Existe também o mecanismo egóico cujo trabalho é evitar que o processo de crescimento ocorra. Portanto, poderia se dizer que ambos desejam a verdade e não a desejam. Porém, o verdadeiro Coração sempre anseia pela verdade, de modo que ainda que o ego possa tentar que permaneçamos detidos presupondo falsamente nosso próprio progresso espiritual, estas presuposições são o verdadeiro inimigo da liberação. Com efeito, a presunção de iluminação bloqueia a possibilidade de autêntica iluminação.
Quem presume ser iluminado?
A maioria das pessoas acreditam que são os charlatões, os tecnogurús e os chamados mestres que sonham com meninas são os que acreditam estar iluminados. Sem dúvida, a presunção de iluminação é muito mais frequente do que se acredita. A maioria dos egos espirituais, bem educados, não se atreveriam a denominar a si mesmos "iluminados", especialmente diante outros, porém em secreto ou não tão secretamente assumem o papel de guia espiritual, mentor, canalizador, psíquico, amigo espiritual, etc., e consideram que as habilidades que tem adquirido ou os conhecimentos que tenham acumulado possui uma importância maior do que na realidade possuem.
Quando nos comprometemos com um caminho espiritual sob uma sabia supervisão, nos damos conta de que a tendência a nos engrandecermos e a engrandecer nossos enganos é mais comum do que imaginamos. Isto só se converte num problema quando somos incapazes de (ou não queremos) aceitar a necessária guia que voltaria a nos situar no lugar adecuado. Necessitamos simplemente aprender a trabalhar com tais presuposições, e o primeiro passo é reconhecer que a presunção de iluminação não se refere aos "outros". Se refere a cada uno de nós.
MARIANA CAPLAN
Fonte: A Metade do Caminho - A Falácia da Iluminação Prematura - Mariana Caplan - Editorial Kairós