Quando algo chega a se popularizar tanto como tem ocorrido atualmente com a iluminação, se perde a essência de seu significado, pois os princípios verdadeiramente espirituais não podem ser comunicados de forma massiva. Não é possível o que pretendem as filosofias da Nova Era, ao dizer que estamos numa era de evolução em que todo o mundo pode alcançar fácilmente a iluminação que antes era acessível só para poucos. Em nenhum momento da história, incluindo a atual "Nova Era", as massas tem tido aversão para adotar o compromisso necessário para alcançar uma vida iluminada.
Uma análise da presunção de iluminação não pode ser completa sem antes clarificar a aguda distinção que há de se realizar entre a espiritualidade Nova Era caseira e os caminhos de liberação tradicionais do que se ocupa este livro. A maioria das filosofias e psicologias da Nova Era oferecem modos de seguir mais comodamente no sono do ego e nos ensinam como nos sentirmos melhor dentro da ilusão de nossas vidas, enquanto que as disciplinas autenticamente espirituais nos ensinam como atravessar esse sono. Isto precisa ficar muito claro, pois os termos "espiritualidade" e "iluminação" tem se tornado tão populares que a maioria das pessoas assume que os psíquicos, os pseudoxamãs e os curadores con cristais estam fazendo o mesmo que os mestres zen, os mestres tântricos Vajrayana e os shaylls sufís tradicionais, e os agrupam a todos sob o tópico da "espiritualidade". Isto constitui um desserviço tanto a estes mestres como a si mesmos.
De modo parecido ao que ocorre com o termo "amor", o termo "iluminação" já não diz muito. Falamos de "amor" para descrever um estado de inflação egóica, nosso apreço pelos gelo ou nossa atitude diante de nosso esposo ou nossos filhos, enquanto que a maioria de nós nem se quer sabe o que é o verdadeiro amor. O mesmo tem chegado a ser certo da iluminação. O fato de que o termo abunde tanto na linguagem coloquial, no New York Times, em Time e em Newsweek, como se todo o mundo entendesse realmente o que significa, fala diretamente desta presunção coletiva errônea acerca da iluminação, na que tem caído todo o mundo ocidental. Quando todo mundo se precipita a falar de iluminação, seu significado diminui mais que se não se pronuncia, que se não se verbaliza. Vivemos num mundo em que as pessoas tem a liberdade, num sentido quase recreativo, de achar o caminho de iluminação.
Sensei Danan Henry é muito crítico com o modo em que a Nova Era utiliza a terminologia espiritual.
Não me importo que os new-ages façam e digam todas essas bobagens, porém sei que me preocupa quando empregam a terminologia das tradições antigas e insistem em que estam falando da iluminação. Não estam falando da iluminação. Falam de um certo tipo de sentimentos, de pensamentos e de sexo. Possuem todos esses bons sentimentos e esses profundos pensamentos e dizem: “Isso é a iluminação”. Ou o chamam o "eu verdadeiro". Empregam palavras como "eu verdadeiro" e estam falando de ter uma maravillosa saúde e um sexo estupendo. Não posso suportá-lo. Na medida em que me afeta, eu diria que nem sequer se acham neste jogo. Este é o ponto em que aparece minha intolerância.
A opinião de Sensei Danan é dura, porém, com razão. Pessoas como Sensei Danan que tem dedicado sua vida a transmitir a realidade representada por palavras como "iluminação" se acham continuamente enfrentados à tarefa de desenredar e desmontar as projeções e as expectativas sobre a vida espiritual que seus estudantes têm adquirido através duma distorção cultural e uma diminuição da terminologia sagrada.
Roshi Mel Weitzman do Centro Zen de Berkeley conta a cena que se aconteceu numa sala de reuniões nos anos setenta, onde estava falando um dos gurús populares do momento. Fora da sala, uma mulher se queixava à pessoa que recolhia as entradas: “Paguei cem dólares para conseguir a iluminação! Quero que me devolvam meu dinheiro!”. O dinheiro não compra a iluminação.
A verdadeira iluminação não se vende na tenda da esquina, não contém conservante e não vem envolta em plástico. O maior presente, a "pérola de grande valor", é a entrega absoluta a Deus ou o Universo, e nunca será barata. Por isso deveriamos nos perguntar pelos sucedâneos de joias que os pseudoespiritualistas vendem com tanta facilidade em seus fantásticos pacotes. Se você quer algo autêntico tem que aprender a respeito das falsificações; de outro modo, você pode ir mostrando orgulhosamente uma pedra na realidade só de aparência diamantina, convencido de que é o Diamante Esperado.
Bem, agora, dizer que a iluminação está se extinguindo não quer dizer que aquelo que o termo representa em sua forma mais pura tenha se extinguido. A iluminação não é nem mais nem menos comum do que sempre o tem sido. Na verdade, tem existido sempre e sempre existirá, e sempre existem os poucos que são capazes de viver a partir dessa verdade. As definições e interpretações modernas da iluminação se desmontam criticamente neste livro para animar as pessoas a não estagnar numa série de experiências e intuições radicais que podem encaixar na definição livresca de iluminação, porém que lhes afastará de possibilidades maiores.
MARIANA CAPLAN
Fonte: A Metade do Caminho - A Falácia da Iluminação Prematura - Mariana Caplan - Editorial Kairós
