O comum nestas tendências é que elas estabelecem a nossa
identidade. Com minha identidade posso afirmar que sou alguém, ou que sou
ninguém, mas que sou alguma coisa porque não suporto a ideia do ser nada.
A esta ideia do nada, a esta sensação do nada, do vazio, é
que devo devotar minhas mais altas honrarias, pois ela é a essência do que sou
em verdade e em natureza real. Mesmo se contra ela eu faço coisas a título de “tapa-buraco”.
O buraco será tapado; mas, dentro em pouco, ele reaparece porque o material
usado para tapá-lo não tinha qualidade.
Qual material está devidamente qualificado a tapar o
buraco?
Nenhum. Porque o buraco não é de natureza material.
Apesar de haver no mundo sortimento insaciável de material para funcionar como
tapume.
O uso contínuo destes materiais conduz, infalivelmente, ao
entibiamento... à tibieza e nada mais. Conforme vamos ficando mais e mais
entediados com o uso de material inadequado para tapar o nosso buraco,
acreditamos que chegaremos a um ponto extremo em que não haverá mais saída,
senão o tapamento definitivo do buraco.
Contudo, este ponto extremo tem a propriedade de ficar
sempre um pouco mais além de onde já chegamos. E o tamponar definitivo
fica adiado... e adiado...
É possível que fique por uma existência inteira adiado...
(Como é possível dizer que uma existência pode ser considerada inteira com a
realidade de um buraco enorme a céu aberto?)
Nem mesmo os insistentes apelos aos céus conseguem
encobrir o buraco em definitivo. O que estes apelos proporcionam é uma ponte
sobre o buraco. Mas a ponte é levadiça. Quando menos esperamos, ela não está
abaixada para que passemos.
A impressão que eu tenho é que a existência encarnada se
assemelha a um percurso espiralado – cheio de buracos – pelo qual somos,
irremediavelmente, forçados a caminhar; algumas vezes, caindo nos buracos –
quando a ponte não está abaixada – outras vezes, passando imune – quando a
ponte levadiça se apresenta.
É só isso mesmo?
LibaN RaaCh