A crucificação, para mim, — indiferente se houve ou não esse momento histórico —, é um arquétipo que aponta para o momento culminante, atingido depois de uma longa Via-crúcis de autoconhecimento, onde corremos de um lado para o outro, em meio a barulhenta e inconsciente multidão, onde caímos e levantamos — por vezes sob o maldoso sorriso de muitos que dela fazem parte — devido o pesado fardo de nossa existência destituída de real inteligência criadora. A crucificação é aquele momento em que nossos pés estão presos para que não possamos dar continuidade a constante fuga para o externo de nós; nossas mãos estão presas para que não possam mais fazer uso de livros, filmes e tantas outras coisas mais, as quais usamos durante nossa Via-crúcis de autoconhecimento. A coroa de espinhos, uma representação da observação do conflituoso e doloroso conteúdo de nossa mente, que nos faz, literalmente, soar, ainda que não seja um suor de sangue, mas um suor psíquico e visceral e não o costumeiro suor de nossa superficial e monótona rotina física. É a representação daquele momento em que, exaustos, finalmente dizemos:
"Pai, em tuas mãos entrego meu espírito... Em Tuas mãos, Pai e, não mais, nas mãos de nenhum guru, de nenhum lugar, de nenhum sistema de crença, de nenhuma prática — por mais brilhantes que estes sejam — a nada mais que seja exterior a este ser que, em Seu Ser, sou".
E isto se dá no topo do Gólgota, que no aramaico tem como significado a palavra "crânio"; é a representação do momento de esfacelamento do intelecto, da razão, da lógica e do nosso inconsciente vício de pensar, para a ocorrência da inefável trans-mentalização.
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