Capítulo II
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O SIGNIFICADO DA RELIGIÃO
Quando adoramos imagens e formas, de fato, estamos adorando a nós mesmos nessas imagens.
Paul Brunton: Vishnu, Shiva e outras Divindades existem mesmo?
Ramana Maharshi: Não somente as almas humanas individuais estão sendo conhecidas. Mas, em vez de perseguir a busca nessa direção, porque você não procura dentro de si mesmo? A quem essas idéias surgem?
PB: No que diz respeito à ajuda de Deus no meu esforço, não é para ser ela alcançada pela adoração, prece, etc.? Não seria isso de grande auxílio?
Ramana: A Graça de Ishvara, adoração a Ele etc., são os degraus intermediários adotados e necessários para serem adotados enquanto o alvo não for alcançado. Ao alcançá-lo, verá que não há diferença entre Deus e SER.
PB: Devo continuar a adoração ao ídolo?
Ramana: Enquanto você pensar que é o corpo, não fará mal. Isso pode até levá-lo à concentração da mente. Procure mante-la num ponto só!
PB: Há um SER separado, Ishvara, que recompensa virtudes e castiga pecados? Ali há Deus?
Ramana: Sim.
PB: Tem Ele forma? Dissolver-se-á na Pralaya*?
Ramana: Pralaya é a mente mantida presa no Maya*.Se você pode, com todos os seus defeitos e limitações, elevar-se pelo Jnana* (conhecimento) a ter consciência do SER — que é além de todo Pralaya e Samsara*, não é razoável estar na expectativa de que Ishvara*, que é infinitamente mais inteligente que você esteja acima e além do Pralaya? Ilumine a si próprio através do autoconhecimento!
PB: Terei de praticar Sandhya? (rituais religiosos cujo ofício é praticado pela manhã e à noite)
Ramana: Se você acha isso necessário, sem dúvida deve praticá-lo.
PB: Os jovens que aprendiam as Escrituras na sua mocidade, à medida que envelheciam achavam isso detestável.
Ramana: A reviravolta do gênio não é por causa da idade, mas por causa da carência de compreensão. Se estivessem corretamente orientados quando moços, apreciariam as Escrituras muito mais na idade madura.
Para as massas, todos os credos não passam de introdução à real Verdade do SER. As religiões não são necessariamente a mais alta expressão ou a mais alta Sabedoria de seus fundadores, considerando as épocas em que viveram, inclusive, a capacidade mental do povo. A mais alta Sabedoria é por demais sutil para a maioria das mentes, de modo que too o esquema sobre o mundo, os deuses, os corpos, a evolução, etc., não deve ser rejeitado porque o povo parece achar mais fácil e preferível acreditar em todas essas coisas do que crer na mais simples Verdade cuja Realidade é uma só: — SER. Dessa maneira, consequentemente, a reencarnação, os planos astrais, a sobrevivência depois da morte, etc., se tornam verdades, embora apenas do ponto de vista inferior. Do mais alto ponto de vista, ou seja, do real SER, todo o resto desaparece como ilusório e somente a Realidade permanece. É verdade que o corpo astral sutil existe, porque no mundo dos sonhos, o corpo é necessário a fim de funcionar naquele mundo, que também é real, mas tão-somente no seu próprio plano, enquanto que um SER é sempre real, sempre e eternamente existente, quer estejamos disso cientes, quer não. Por isso é melhor procurar este, porque os outros seres-corpos só relativamente são reais.
Um cristão comum fica satisfeito somente quando lhe falam que Deus está nalgum lugar longínquo do Céu — e não para que seja encontrado por nós mesmos exclusivamente; que somente o Cristo O conhecia e somente Ele pode salvar-nos. Por essa razão, quando Jesus afirma uma simples Verdade, que o Reino do Céu está dentro de nós, o cristão não está satisfeito e procura dar interpretações muito afastadas daquela afirmação. Somente a mente madura pode aprender uma simples Verdade em toda a sua nudez.
PB: O que o senhor pode dizer-me a respeito dos ídolos?
Ramana: Eles têm profundo significado. Sua adoração é um método que faculta concentração mental. A mente está acostumada a trabalhar fora, externamente. Ela precisa ser detida e dirigida para dentro. Possui ela o hábito de guardar por muito tempo os nomes e formas de todos os objetos externos, que possuem nomes e formas. Tais nomes e formas são símbolos de concepção mental que desviam a mente de seu curso habitual e levam-na para dentro de si mesma. Os ídolos, mantras, sílabas sagradas, rituais, etc., todos eles são alimentos que nutrem a mente em sua volta para dentro de si e, deste modo, tornam-na capaz de concentrar-se, somente antes que o estado supremo seja alcançado.
Ishvara possui individualidade na mente e no corpo, ambos perecíveis, porém, ao mesmo tempo Ele te Consciência Transcendental e libertação intrínseca.
Ishvara, Deus pessoal, ou Supremo Criador do universo, não existe. (Esta verdade vem do relativo ponto de vista para quem não compreendeu a Verdade última, para quem acredita na realidade de uma alma individual). Do ponto de vista do absoluto, o Sábio não aceita nenhuma outra existência, salvo a do SER impessoal Único e Sem Forma.
Ishvara tem corpo material, forma e nome, embora não seja denso como é o corpo de matéria sólida. Ele pode ser percebido em visões na forma que o devoto o cria. Há diversas formas e nomes de Deus, variando de acordo com as religiões. Sua essência é igual à nossa. Somente o SER real é UM e sem forma. Portanto, as formas que Deus assume são apenas criações ou aspectos.
Ishvara é imanente em cada pessoa e em cada objeto em toda a parte do Universo. A totalidade de todas as coisas e todos os seres constitui Deus. É um poder cuja fração tem-se tornado todo esse Universo, e cujo excesso fica em reserva. Tanto esse Poder em reserva quanto a energia manifestada como mundo físico, constituem juntos, Ishvara. Para adorar a esse Criador, o homem deve compreender a Natureza de Deus e a sua relação com Ele. Toda conduta moral, cada pensamento racional, é uma adoração correta para com esse Deus.
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Paul Brunton - A Imortalidade Consciente - Editora EDC_________________________
Pralaya, segundo a Teosofia, é o periodo de tempo do ciclo de existência dos planetas em que não ocorre atividade.
Maya (do sânscrito माया, māyā) é um termo filosófico que tem vários significados, mas em geral se refere ao conceito da ilusão que constituiria a verdadeira natureza do universo objetivo. Maya deriva da contração de ma, que significa "medir, marcar, formar, construir", denotando o poder do deus ou demônio de criar ilusão, e ya, que significa "aquilo".
Jñāna, também grafada como Gyāna (em devanagari: ज्ञान), é o termo sânscrito para conhecimento.
Samsara (sânscrito-devanagari: संसार: , perambulação) pode ser descrito como o fluxo incessante de renascimentos através dos mundos.