Capítulo VI
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AS CARACTERÍSTICAS DA DISCIPLINA
Ramana: Por causa dos Vasanas¹ (imagens, tendências, condicionamentos). Mas realmente isso é fácil, já que nós somos o SER. O que temos que fazer é lembrar-nos disso. Temo-lo mantido no esquecimento e, assim, pensamos que somos o corpo ou este ego. Se a vontade e o desejo de lembrar-se do SER fossem bastante fortes, eles, eventualmente, superariam Vasanas. Aí deve travar-se uma grande batalha, declarada no íntimo, o tempo todo, até que o SER esteja conscientizado. Essa batalha da qual simbolicamente fala a Escritura bíblica, é como o combate entre Deus e Satanás. Em nosso Sruti² é no Mahabarata³, onde os "Asuras" representam nossos pensamentos ruins e os "Devas", nossos elevados pensamentos.
PB: Como se pode apressar esta chegada da Realização?
Ramana: Quando alguém tenta seriamente conhecer ser verdadeiro "EU", o apego aos objetos, os maus e degradantes pensamentos gradativamente vão abandoná-lo. Quanto mais nos lembramos do SER, tanto mais qualidades elevadas adquirimos. Então, a Realização eventualmente talvez venha.
PB: Por que no Upanishad está escrito: "Só àquele que Atman escolhe, Ele se revela, e não aos outros"? Isso não lhe parece um tanto arbitrário?
Ramana: Não. Está correto. Pois o escolhido é pessoa que se devota a Ele, torna-se seu devoto. Ele o atrai para dentro de si. Só voltando-se para dentro é que se pode encontrar Atman. Quem pensa nisso O atrairá a si.
Os pensamentos tais como "chegar à consecução do SER é difícil" ou "auto-realização está longe de mim", ou "tanta dificuldade tenho a superar para conhecer a Realidade" devem ser absolutamente banidos, pois, precisamente esses pensamentos impedem a Realização. São criações do falso ser, do ego, não são verdadeiros. Nunca duvide de ser você a Realidade; viva nessa compreensão. Nunca questione em adiar sua realização para algum tempo futuro. Isso porque as pessoas estão vitimadas e hipnotizadas por semelhantes pensamentos falsos. O Bhagavad Gita diz: "Poucos entre os milhões são os que realizam o SER".
A ordem de Ashrama foi estabelecida como base fundamental, isto é, tem sido regularizado o desenvolvimento gradual dentro do normal decurso da humanidade. Contudo, no caso de alguém estar plenamente amadurecido e altamente adiantado em "Auto-Inquirição", não haverá necessidade do desenvolvimento gradativo. Neste caso de auto-indagação a respeito de seu próprio SER, os resultados são imediatos e rápidos e a percepção clara.
PB: Sou digno de ser um devoto?
Ramana: Cada um pode ser um devoto. O alimento espiritual é oferecido a todos e nunca é negado a ninguém.
Para um devoto desanimado, a pergunta deve ser feita assim: "quem está desanimado?" É um fantasma do ego cuja queda oprime e torna vítimas de semelhantes pensamentos. No sono, a pessoa não fica aflita. O estado de sono é um estado normal. Pergunte e descubra. Será que não encontra reminiscência de paz em meditação? Esse é o sinal de progresso; paz será mais profunda e mais prolongada à medida da pratica contínua. Isso também leva ao alvo.
E quanto mais você sustentar que é um ignorante, tanto mais informado será para fazer com que seu caminho para a remoção da ignorância se torne fácil. O homem é um louco quando diz que ele é louco?
A restrição do desejo da mente e a meditação estão sendo mutuamente dependentes. Devem andar lado a lado... A meditação, no devido tempo, será bem sucedida.
Se você procura Deus de todo seu coração, então pode estar seguro de que a Graça de Deus também o está procurando.
PB: Quando tropeçamos e caímos no caminho, que devemos fazer?
Ramana: Tudo dará certo no fim. Basta uma firma decisão de que você porá seus pés novamente no caminho, mesmo depois da queda ou quebra. Com o tempo, pouco a pouco, os obstáculos vão se enfraquecendo e suas energias se tornando mais fortes. Tudo dará certo no fim. A única coisa que se pede é uma firme determinação.
PB: Minhas tendências inatas fazem com que me distraia. Podem ser cortadas pela raiz?
Ramana: Sim. Os outros já o fizeram. Por conseguinte, acredite nisso. Eles conseguiram porque acreditaram que podiam fazê-lo. Isso podia ter sido feito pela concentração. Naquilo que é livre de predisposições e continua sendo o âmago deles.
Se o anseio estivesse aí, a Realização estaria forçada a vir, mesmo que você não quisesse.
PB: É necessário desenvolver qualidades?
Ramana: Somente para principiantes, por revelarem tendências a desenvolver diferentes tipos de qualidades. Para os adiantados é suficiente olhar para dentro de sua própria natureza. Este é o método direto. Todos os outros caminhos envolvem o ego. Somente este responde à pergunta "o que é ego?". O Yoga diz que a pergunta "que sou eu?" é um eixo que leva à raiz do ego e o destrói.
PB: Receio que este último alvo não seja coisa fácil de buscar.
Ramana: Por que ridicularizar a si próprio pelo receio de sucesso ou fracasso no seu percurso? Vá em frente! Entregue-se à meditação profunda. Afaste todas as outras compensações da vida. A vida calculista não será coroada de êxito espiritual.
Sim, a entrega total é impossível no início. A entrega parcial é certamente possível para todos; no decorrer do tempo, isso levará à entrega completa. Bem, se a entrega parcial fosse impossível, como fazer então? A mente não tem paz. Você está impotente para trazê-la de volta. Isso poderia ser feito somente pela entrega.
De fato, aí não se pode encontrar uma única pessoa no mundo possuindo todas as qualidades em perfeição necessária para aquele que abriu mão dos desejos, como mencionado em Yoga Sutra, etc. Ainda assim, a busca da alma revestida de sabedoria não deverá ser abandonada. Cada um é o SER, embora não esteja cônscio disso, e, identificando o SER com o corpo, sente-se miserável.
Todas as vezes que você tiver pensamento sobre a dificuldade, disponha dele completamente, procurando descobrir com que motivo e de onde surgiu.
PB: Sou eu capaz de vislumbrar o SER? Parece tão difícil?
Ramana: Você já é o SER. Não obstante, a percepção é de cada um. A conscientização não conhece diferença entre os aspirantes. Esta sua dúvida: "será que eu sou capaz de vislumbrar", ou a sentença: "ainda não conscientizei" são obstáculos. Fique livre disso também.
PB: Não obstante, a menos que eu tivesse experiência, como posso me libertar desses conflitantes pensamentos?
Ramana: Também estes estão na sua mente. Ficam aí porque você identificou-se com o corpo. Do momento em que essa errada identificação deixar de pertencer-lhe, a ignorância desvanecer-se-á e a Verdade lhe será revelada.
PB: O senhor aceita a parábola de Jesus, onde a mulher procura uma moeda perdida até encontrá-la?
Ramana: Por que não? Nesta parábola sabemos que Deus está buscando as almas. A alma humana sempre aproveita a Graça de Deus. Não obstante, o homem deve pelo menos aceitá-la. Você conhece a luz solar. Se fechasse os olhos e dissesse que o sol não se encontra aí, isso seria culpa sua e não do sol. Se a Graça de Deus não o tocar, isso não significa que Deus está de má vontade, e sim, que você não se entregou a Ele completamente. Deus é Graça.
De acordo com seu estado de desenvolvimento preparatório você poderá estar cônscio da Graça.
PB: Como se pode apressar esta chegada da Realização?
Ramana: Quando alguém tenta seriamente conhecer ser verdadeiro "EU", o apego aos objetos, os maus e degradantes pensamentos gradativamente vão abandoná-lo. Quanto mais nos lembramos do SER, tanto mais qualidades elevadas adquirimos. Então, a Realização eventualmente talvez venha.
PB: Por que no Upanishad está escrito: "Só àquele que Atman escolhe, Ele se revela, e não aos outros"? Isso não lhe parece um tanto arbitrário?
Ramana: Não. Está correto. Pois o escolhido é pessoa que se devota a Ele, torna-se seu devoto. Ele o atrai para dentro de si. Só voltando-se para dentro é que se pode encontrar Atman. Quem pensa nisso O atrairá a si.
Os pensamentos tais como "chegar à consecução do SER é difícil" ou "auto-realização está longe de mim", ou "tanta dificuldade tenho a superar para conhecer a Realidade" devem ser absolutamente banidos, pois, precisamente esses pensamentos impedem a Realização. São criações do falso ser, do ego, não são verdadeiros. Nunca duvide de ser você a Realidade; viva nessa compreensão. Nunca questione em adiar sua realização para algum tempo futuro. Isso porque as pessoas estão vitimadas e hipnotizadas por semelhantes pensamentos falsos. O Bhagavad Gita diz: "Poucos entre os milhões são os que realizam o SER".
A ordem de Ashrama foi estabelecida como base fundamental, isto é, tem sido regularizado o desenvolvimento gradual dentro do normal decurso da humanidade. Contudo, no caso de alguém estar plenamente amadurecido e altamente adiantado em "Auto-Inquirição", não haverá necessidade do desenvolvimento gradativo. Neste caso de auto-indagação a respeito de seu próprio SER, os resultados são imediatos e rápidos e a percepção clara.
PB: Sou digno de ser um devoto?
Ramana: Cada um pode ser um devoto. O alimento espiritual é oferecido a todos e nunca é negado a ninguém.
Para um devoto desanimado, a pergunta deve ser feita assim: "quem está desanimado?" É um fantasma do ego cuja queda oprime e torna vítimas de semelhantes pensamentos. No sono, a pessoa não fica aflita. O estado de sono é um estado normal. Pergunte e descubra. Será que não encontra reminiscência de paz em meditação? Esse é o sinal de progresso; paz será mais profunda e mais prolongada à medida da pratica contínua. Isso também leva ao alvo.
E quanto mais você sustentar que é um ignorante, tanto mais informado será para fazer com que seu caminho para a remoção da ignorância se torne fácil. O homem é um louco quando diz que ele é louco?
A restrição do desejo da mente e a meditação estão sendo mutuamente dependentes. Devem andar lado a lado... A meditação, no devido tempo, será bem sucedida.
Se você procura Deus de todo seu coração, então pode estar seguro de que a Graça de Deus também o está procurando.
PB: Quando tropeçamos e caímos no caminho, que devemos fazer?
Ramana: Tudo dará certo no fim. Basta uma firma decisão de que você porá seus pés novamente no caminho, mesmo depois da queda ou quebra. Com o tempo, pouco a pouco, os obstáculos vão se enfraquecendo e suas energias se tornando mais fortes. Tudo dará certo no fim. A única coisa que se pede é uma firme determinação.
PB: Minhas tendências inatas fazem com que me distraia. Podem ser cortadas pela raiz?
Ramana: Sim. Os outros já o fizeram. Por conseguinte, acredite nisso. Eles conseguiram porque acreditaram que podiam fazê-lo. Isso podia ter sido feito pela concentração. Naquilo que é livre de predisposições e continua sendo o âmago deles.
Se o anseio estivesse aí, a Realização estaria forçada a vir, mesmo que você não quisesse.
PB: É necessário desenvolver qualidades?
Ramana: Somente para principiantes, por revelarem tendências a desenvolver diferentes tipos de qualidades. Para os adiantados é suficiente olhar para dentro de sua própria natureza. Este é o método direto. Todos os outros caminhos envolvem o ego. Somente este responde à pergunta "o que é ego?". O Yoga diz que a pergunta "que sou eu?" é um eixo que leva à raiz do ego e o destrói.
PB: Receio que este último alvo não seja coisa fácil de buscar.
Ramana: Por que ridicularizar a si próprio pelo receio de sucesso ou fracasso no seu percurso? Vá em frente! Entregue-se à meditação profunda. Afaste todas as outras compensações da vida. A vida calculista não será coroada de êxito espiritual.
Sim, a entrega total é impossível no início. A entrega parcial é certamente possível para todos; no decorrer do tempo, isso levará à entrega completa. Bem, se a entrega parcial fosse impossível, como fazer então? A mente não tem paz. Você está impotente para trazê-la de volta. Isso poderia ser feito somente pela entrega.
De fato, aí não se pode encontrar uma única pessoa no mundo possuindo todas as qualidades em perfeição necessária para aquele que abriu mão dos desejos, como mencionado em Yoga Sutra, etc. Ainda assim, a busca da alma revestida de sabedoria não deverá ser abandonada. Cada um é o SER, embora não esteja cônscio disso, e, identificando o SER com o corpo, sente-se miserável.
Todas as vezes que você tiver pensamento sobre a dificuldade, disponha dele completamente, procurando descobrir com que motivo e de onde surgiu.
PB: Sou eu capaz de vislumbrar o SER? Parece tão difícil?
Ramana: Você já é o SER. Não obstante, a percepção é de cada um. A conscientização não conhece diferença entre os aspirantes. Esta sua dúvida: "será que eu sou capaz de vislumbrar", ou a sentença: "ainda não conscientizei" são obstáculos. Fique livre disso também.
PB: Não obstante, a menos que eu tivesse experiência, como posso me libertar desses conflitantes pensamentos?
Ramana: Também estes estão na sua mente. Ficam aí porque você identificou-se com o corpo. Do momento em que essa errada identificação deixar de pertencer-lhe, a ignorância desvanecer-se-á e a Verdade lhe será revelada.
PB: O senhor aceita a parábola de Jesus, onde a mulher procura uma moeda perdida até encontrá-la?
Ramana: Por que não? Nesta parábola sabemos que Deus está buscando as almas. A alma humana sempre aproveita a Graça de Deus. Não obstante, o homem deve pelo menos aceitá-la. Você conhece a luz solar. Se fechasse os olhos e dissesse que o sol não se encontra aí, isso seria culpa sua e não do sol. Se a Graça de Deus não o tocar, isso não significa que Deus está de má vontade, e sim, que você não se entregou a Ele completamente. Deus é Graça.
De acordo com seu estado de desenvolvimento preparatório você poderá estar cônscio da Graça.
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Palavras de Ramana Maharshi dirigidas à Paul Brunton, extraídas do livro "IMORTALIDADE CONSCIENTE" - Paul Brunton - Editora EDC__________________
¹ Vasanas - tendências subconscientes do caráter forjadas a partir de um substrato formado pelos condicionamentos culturais, sociais, familiares, etc.
² Shruti (do Sânscrito "aquilo que é ouvido") é um cânon de escrituras hindus. Não data a um período particular, mas atravessa a história inteira do Hinduísmo, começando com os textos mais antigos conhecidos, com alguns Upanishads mais recentes chegando até os tempos modernos.
³ O Maabárata conhecido também como Mahabarata ou Mahabharata (devanágari: महाभारत, transl. Mahābhārata), é um dos dois maiores épicos clássicos da Índia, juntamente com o Ramáiana. Sua autoria é atribuída a Krishna Dvapayana Vyasa. O texto é monumental, com mais de 74.000 versos em sânscrito, e mais de 1,8 milhões de palavras; se o Harivamsa for incluído como sendo anexo e parte da obra, chega-se a um total de 90.000 versos, compondo o maior volume de texto numa única obra humana.